Como sempre tive vontade de fazer ultramaratonas e corridas
de montanha, nada mais justo do que fazer a inscrição nos 42 km. Minha primeira
maratona, só que no mato, sem montanha.
Já nos treinos, percebi que o buraco era mais embaixo. Comecei a sentir bastante desconforto nos treinos longos. As dores apareciam
sempre depois dos treinos, mais precisamente, quando pisava os pés na varanda
de casa. Senti um medo danado de lesionar antes da prova. E durante também. Até
fiz uma resenha de treino aqui no blog... Tá aí o link: Resenha de treino
Chegou o grande dia!
Chegou o grande dia!
A largada atrasou porque um poste caiu na vila da Praia do Forte, que impediria a passagem dos atletas nos percursos de 21 e 42 km. A organização publicou uma nota oficial sobre o acontecido.
Com o atraso, meu corpo já tinha usado meu rico café da
manhã, feito com todo carinho pelo meu maridinho. Mas, aventureiro que se preza
sempre leva uma comidinha reserva.
Largamos! Só que, na saída do Castelo Garcia D’Ávila, quase
todo mundo virou à direita. Só entendi o que aconteceu depois da explicação da organização. E até conseguir resgatar todos que já estavam correndo loucamente, demorou um pouquinho. Paciência... Melhor no começo da
prova do que no meio.
Antes de continuar a resenha, quero dizer que acho vaia uma coisa
tão deselegante e sem educação que tenho vergonha alheia. Morro de vergonha!
Problemas acontecem e quem fica insatisfeito com a situação deve ir direto à
organização pra reclamar e até pedir seu dinheiro de volta. Gente, deu o maior
trabalho pra tirar alguns “?*&#@%” da frente do pórtico pra recomeçar a
prova.
Continuando...
Larguei junto com meu amigo Scavuzzi, nos 42 km, e meu
treinador Tadeu, nos 21 km. Pensei em fazer o percurso todo num ritmo
confortável, dentro do possível.
Começamos com uma descida por trilha aberta, pegamos um singletrack à
esquerda, seguindo em direção à praia nos primeiros 3 km. Depois de poucos
metros à beira mar, voltamos por um trecho de areia fofa para passar por dentro
da vila da Praia do Forte. Aquele pedacinho ali estava bem gostoso! Um pouco
de sombra, um pouco de sol, trote leve pra não cansar, 21 e 42 km só na maciota.
Passamos na igrejinha da Praia do Forte, pegamos a praia em
direção à papa-gente, à esquerda. Destaque para a maré cheia! A água batia
naquela parede do Projeto Tamar, deixando o percurso um tanto quanto
emocionante. Eu, magricela, pequena e leve, comecei a desequilibrar nas pedras.
Tinha gente nadando, mergulhando, fazendo miséria pra andar rápido. Magricela,
pequena e leve, preferi me apoiar na parede pra não ser derrubada pela onda,
que chegava à minha cintura em seus momentos mais agressivos. Meu celular
àquela altura, poderia ter se afogado. Levei pra usar o aplicativo Endomondo.
Aquele que a mulher fica falando os quilômetros durante o percurso. Pois é!
Estávamos quase no km 7. Scavuzzi estava bem adiantado e Tadeu, não via mais... Quando
vi que a porra tava pegando mesmo, arrumei um amigo pra segurar na mão. Toda
falante, disse ao rapaz ao lado que era bem melhor passar por aquele trecho
quando um se apoiava no outro. Foi o que me ajudou a sair mais rápido de lá.
Isso é bom pra gente ver que, acima da competitividade, tem solidariedade entre
os atletas.
Foto: Hugo Coelho |
Saindo das águas salgadas do mar da Praia do Forte, meus pés
estavam ensopados. Diria até temperados. Vi gente tirando tênis mas, não sei
parar pra fazer essas coisas, não. Dez pontos para os corredores de aventura! A
gente corre com os pés ensopados de lama, de areia, de cocô de boi, de qualquer
coisa. Tirar tênis só na transição, rs! Como maratona não tem transição, esquece essas coisas. Quem não gostou muito dessa história de correr
na areia inclinada da praia foi o meu tornozelo esquerdo. Doeu um pouquinho.
Durante esse trecho, conheci um conterrâneo de Catu,
Rodrigo. Conversamos sobre quase todas as pessoas e parentes em comum. Bem
que meus amigos disseram que a minha dificuldade seria não ter alguém pra
conversar durante a corrida. Puxei papo com todo mundo que encontrava, rs!
Foram 2 km de areia, até adentrar o continente para mais 1 km
de areia fofa. Tinha até gente falando que o diretor técnico da prova tinha feito aquele percurso porque fazia Corrida de Aventura, blá, blá, blá. Putz!
Quanta areia! Ainda bem que acabou! Entramos, para felicidade de todos e o bem geral da nação, num parque ecológico com um calçamentozinho pra dar uma refrescada. Foi ali que encontrei alguns
aventureiros, como Taty Pinheiro e Fábio, e reencontrei Scavuzzi. Até emprestei um
elástico pra Taty prender aquelas madeixas enormes. Tava parecendo uma doida,
correndo de cabelos ao vento, toda suada, rs!
Tinha muitas garotas por ali. Como não gosto de ficar
olhando pra saber quem é de 21 ou 42 km, não imaginava como estava minha situação. Quando terminou o
parque estávamos no km 14. Deixei todos os amigos queridos pra trás para
manter o ritmo constante. E fui fazendo
outros amigos pelo caminho. Os que estavam num ritmo parecido com o meu iam me
fazendo companhia. Subimos, eu e meu outro novo amigo, conversando até o
aeroclube de Praia do Forte. Logo em seguida me desgarrei de novo pra correr
pra Sapiranga.
Sentia uma alegria deliciosa, um frescor no peito ao pensar
que começaria a melhor parte do percurso. Pelo cruzamento do Castelo, segui (sem
amigo) em direção à estrada, passei por debaixo da ponte e entrei na Sapiranga.
Ali, ficava a bifurcação que separava o povo de 21 do povo de 42 km. Arnaldinho
estava lá, e Paulinho também... Uma menina passou por mim voando! Sem
sacanagem, pensei que ela estava pegando o caminho errado. Primeiro pela
velocidade, depois pelo tamanho do short. Juro! Fiquei preocupada. Se eu
fizesse 42 km com aquele shortículo chegaria completamente assada ao final da
prova. Faltava chão pra caramba!
Raiai, rsrsrs!...
Aquela subida da Sapiranga é de lascar o cano! Correndo
então, nem se fala. A menina sumiu. Lá em cima, entrei numa trilha para chegar até o asfalto
que vai pra Lagoa Aruá. Mais ou menos aos 19 km, Claudia e Hugo, que
estavam fotografando a prova, avisaram que eu era a terceira mulher da prova.
Hum!! Que legal! E meu objetivo era só terminar. Entretanto, não era hora de
comemorar. Não estava nem na metade do caminho. Tinha gente atrás de mim. Na
frente também. Quem sabe eu não achava alguém na frente? A coisa
estava fluindo tão bem...
Foto: Sandrinha Midlej Fotógrafa |
Depois do km 20, avistei uma saia preta, numa subida de
singletrack. Aquele foi o primeiro momento da prova em que deixei de correr
para fazer um trekking forte. O trekking digno que uma Aventureira do Agreste.
Com detalhe para as pernas, que doem mais no trekking do que correndo. Na
verdade, nem estava sentindo dor ao correr. O problema era que precisava harmonizar
fôlego e força. Ainda assim, ultrapassei a segunda colocada na ladeira mesmo. E
voltei a correr assim que acabou a subida.
E nunca mais olhei pra trás. Não olho mesmo! Se já estou
fazendo tudo o que posso, não preciso olhar pra trás. Fico afobada e não ajuda
em nada. Não faria melhor do que aquilo.
Até pouco mais de 25 km era verde, verde e verde. Uma trilha
linda e refrescante. Estava me sentindo ótima! Em Malhadas, peguei poucos
metros de asfalto e voltei pra trilha. Paulinho estava lá de novo, anunciando
que dali era só volta. Rsrsrs! Como assim, só volta?! Faltava chão como a
zorra! Faz a conta aí! Quarenta e dois menos vinte e cinco?
Vinte e seis quilômetros e eu estava numa estrada em direção
à porteira de uma fazenda, procurando uma sombra pra correr. O dia estava lindo
para pegar uma praia. Meus treinos foram todos à noite, por pura falta de
tempo. Mas, sem querer me gabar, nisso eu também sou boa. Mais dez pontos para os corredores de aventura. A gente corre de dia ou de noite. Sabe se lenhar!
Por isso, não perdia nenhuma oportunidade de me hidratar e jogar água na cabeça, pra não botar tudo a perder. Levei dois litros de água de côco na mochila,
que saiu de casa congelada. Corri na base da água de côco, rs!
Que fazenda linda! Tinha um lago maravilhoso, vegetação
peculiar! Só não tinha sombra, rs! Passei por Felipe caminhando para aliviar as
câimbras, quando descia em direção ao lago, lá pelos 30 km, perto de
terminar o trecho de estradão da fazenda. Ele parecia bem! Só tentava administrar a câimbra.
As pessoas do staff sempre me
animavam durante o percurso. Entrei em outra mata fechada, deixando uma torcida
pra trás, junto com outro novo amigo. Este parecia cansado, alternando
caminhadas com corrida. Acabei fazendo um trekking básico naquela subida longa que, embora tivesse leve inclinação, tentava acabar comigo. Na boa, tive a sensação que não conseguiria voltar a
correr. Caminhar é mais difícil pra mim. Sério! Comecei a sentir
um baixo astral esquisito, tomando conta dos meus pensamentos. Se não tivesse
“sanguenozóio”, terminaria a prova caminhando dali em diante. Os pensamentos
negativos foram completamente espantados por uma guerreira que tenho aqui
dentro. Lembrava do meu amigo Josemar, que sempre me chamou de guerreira. Cheia de coragem e com o peito estufado, voltei a correr e deixei o meu mais
recente amigo pra trás, que me animou, dizendo que quando eu chegasse no
asfalto ia voar. Não sabendo ele que não tinha nenhum asfalto dali em diante,
rs! Lá da frente, falei alto, que eu gostava mais de mato e saí correndo
pelos matos afora.
Então, passei por Cleverson, que também precisou dar umas caminhadas para aliviar as pernas. Percebi, então que todas as pessoas que tiveram câimbra na prova, estavam usando meias de compressão. Fiquei até feliz por deixar as minhas em casa. Ainda bem que os meninos conseguiram terminar a prova com sucesso! A galera da corrida de aventura mandou muito bem na Running!
Então, passei por Cleverson, que também precisou dar umas caminhadas para aliviar as pernas. Percebi, então que todas as pessoas que tiveram câimbra na prova, estavam usando meias de compressão. Fiquei até feliz por deixar as minhas em casa. Ainda bem que os meninos conseguiram terminar a prova com sucesso! A galera da corrida de aventura mandou muito bem na Running!
Pena que a moça do Endomondo parou de falar no km 32! Tive
que continuar a prova mais sozinha do que sozinha. Aliás, corri sozinha por,
pelo menos uns 15 km, conversando comigo mesma.
Finalmente, chegou o trecho da Sapiranga outra vez. Minhas
pernocas estavam bem cansadas. As crianças dali fizeram um alvoroço com minha
passagem. Fiz a festa! Naquele momento, pensei nos meus filhos queridos. Pensei
em Vitor, que me esperava na chegada. Será que ele sabia que eu estava em
segundo? Será que eu conseguiria continuar em segundo? Veio um rampante de
emoção que encheu meu coração de alegria ao imaginar o momento da chegada. Meu
sorriso se abriu.
Entrei na Reserva, minha amiga de longas datas, faltando pouco pra chegar (uns 7 km). Fico bem lá dentro. Com ajuda da energia da natureza,
subi as poucas ladeiras fazendo trekking, buscando todas as forças do universo.
Tudo que ouvia era o barulho do rio e dos bichos fugindo dos meus pés. Vi
cobra, guaiamum, ouvi barulhos esquisitos.
Estava doida pra jogar meus óculos fora! Trambolho da zorra!
Além desse incômodo, meus pés estavam reclamando dos bolos de areia do mar,
minhas unhas queriam pular dos dedos e meus peitos estavam feridos pelo top assassino,
que foi escolhido à dedo por não incomodar nos treinos. Foi quase uma eleição de
equipamentos e roupas confortáveis antes da prova pra passar por aquilo, rs!
Joguei meus óculos pra Arnaldo na saída da trilha. A
respiração começara a descompassar. Os últimos 3 km foram sofridos. Não acabava nunca! O corpo não queria mais brincar daquilo. Mesmo assim, continuei
correndo até chegar à última ladeira da prova. Depois da subida, o alívio... Quase
não acreditei que saí na boca da chegada! Era só entrar no estacionamento do
Castelo Garcia D’Ávila e seguir para o pórtico de chegada, que era outra
subidinha leve. E foi ali, depois do pórtico, que desabei, numa mistura de emoção com falta
de fôlego, não conseguia respirar. Respirava pela metade. Nem consegui abraçar
Vitor direito. Ainda bem que essa sensação durou pouco. Deitei no chão e
comecei a tagarelar com os amigos,
contando as histórias da prova.
Agradeço de todo coração aos amigos queridos que me acolheram
na chegada. Claudia, Bruno, Hugo, Lene, Plínio, Kassie, Sandra, incluindo meu
marido lindo. Agradeço aos meus amigos Aventureiros do Agreste, que sempre
dizem que sou muito melhor do que realmente sou, rs! Ao meu treinador, Tadeu da
Rumos Treinamento, que acha a mesma coisa. Minha família, meus amigos de corrida de aventura, meus
amigos de todos os tempos. Acreditem, lembrei de todo mundo na corrida. Até da
minha professora de pilates, Marina Peixoto, que me mandava estufar o peito pra respirar melhor na hora de correr. Tive a sorte de encontrar ótimos profissionais, a começar pelo meu primeiro treinador, Navarro, que me ensinou a correr.
No dia do Running Daventura, a Energia Divina conspirou em meu favor. Que bom que
consegui! Consegui mais do que o proposto! Subi no pódio em segundo lugar com 5h11m de prova. O
resultado oficial ainda não saiu mas, acho que fiquei em primeiro na categoria
e sétimo no geral da maratona, de 80 inscritos. Depois eu confirmo.
Ah! Quem ganhou foi a menina do shortinho. Jogou duro e não
pareceu assada, rs! Chegou 14 minutos antes de mim. Arrasou!
Parabéns à todos da organização do Running Daventura! Que
prova!
Comentários
Parabéns!!!!Aplausos. Compartilho da mesma opinião sua. Que vaias, deselegância não cabem em um evento esportivo. Levem suas comidinhas como vc fez. Gostei muito do seu blog, apesar de não ser a primeira vez que visito. Visitei outros momentos e quando você participou da RD acho que ano passado.
Abs e até mais
Também participei, mas fui de 21.
Parabéns mesmo, acho que foi mais um exemplo claro da vitória da mente sobre o corpo.
www.runnerhostil.blogspot.com.br
Jamile, a menina tinha pernas lindíssimas mesmo! Também achei! Beijos e até breve!
Tenho fotos suas no pódio, me envie um e-mail que te encaminho: fernandogazzola@gmail.com
Sua família deve estar toda orgulhosa hehehe
Bjo