É uma longa história!
Não lembro em que ano participei da última Odisseia mas sei que cada postagem dos amigos em alguma delas sempre me
causou inveja de doer! Tem Odisseia na Paraíba, em Alagoas, Sergipe, Pernambuco... A coisa aconteceu “no susto”! Decidimos, nos
inscrevemos, compramos passagens e pronto, acabou! Dali em diante era só
organizar as coisas e a vida.
Chegamos em Cabo de Santo Agostinho na sexta à noite, junto
com o quarteto do Ceará, Bichos Escrotos, com o qual compartilhamos o tranfer aeroporto/hotel/aeroporto. Tinha equipe de um monte de lugar. Chegando lá, fomos nos misturando, organizando as
coisas, montando as bicicletas.
Por falar em montar bicicletas, ainda estou pra conhecer um
cara que saiba fazer mais coisas do que Vitor. E se ele não souber, aprende. O
bicho é virado no “istopô”! Montou e desmontou as bicicletas numa
categoria que o avião poderia dar piruetas no céu que não mexia nada.
Inscrição com hospedagem inclusa é tudo de bom! Largada e
chegada no hotel, melhor ainda! Sérgio Bandeira é um cara Jurássico em
Corrida de Aventura, tanto como atleta, quanto como organizador. Pensa em tudo! O Briefing é tão detalhado
que você precisa ficar atento pra não perder nada. Mapa de lona, Racebook com
informações de ouro. Sem contar que a corrida tinha pista de 25, 50 e
100km. Atletas com objetivos de tamanhos diversos.
Com nossos amigos BBBrindes |
Pelo briefing já dava pra saber onde a gente tinha se
metido. O mapa com escala de 1:25.000 só tinha dois PCs. Pasmem! Eram
quatro mapas. Os outros três seriam entregues no percurso, durante a prova.
Lembrei muito das provas da Paletada e fiquei muito feliz com isso. Adoro
quando é muito ruim!
Na linha de largada, também estavam os amigos da BBBrindes
com sua nova formação em quarteto e seu apoio Master, Ana Paula. Eles são fofos
e a gente sempre ponga na “genteboísse” deles! Rs! As fotos lindas são
garantidas! Sem contar que, vira e mexe, trocamos figurinhas pelos matos.
Vamos à prova, então! Que emaranhado de trilha retado! Se todos o
outros mapas estivessem iguais, não seria brincadeira! Imagina planejar tudo no
meio da prova? A cabeça já doida! Será que Tico e Teco se entenderiam?
Às 9 da manhã partimos ladeirão acima pra o primeiro trecho
de trekking de 17km. Fizemos a estratégia de pegar o PC na sequência sugerida no mapa. Sobe, desce, trilhos de trem, canavial pra dentro,
trilha como a zorra e sol no meio da cara! Conseguimos alcançar o planejado
estradão. Daquele tipo que o vento não pode bater que sobe uma poeira fina que
nunca mais vai sair dos pulmões.
O PC1 sempre é uma experiência tensa pra mim mas Sérgio
colocou tudo no lugar certo, não tinha como errar. Depois de muito subir e
descer, achamos o dito cujo numa árvore pintada de amarelo com um picotador
amarrado fortemente.
Alcançamos a tal estrada de poeira fina novamente, depois
nos jogamos pelo canavial pra cair em
outro estradão. O legal desse pedaço da história foi que pegamos uma hipotenusa de uma trilha que formava um triângulo, e já saímos lá embaixo, quase no final da
pista. Cortamos um caminho massa! Indo,
indo, indo, encontramos um riacho pra refrescar a cuca. Riacho é tudo de bom!
Encontramos o PC2, dentro de uma mata, numa árvore
pintada de amarelo. O dono da casa no início da trilha estava muito chateado
porque alguma equipe saiu de lá com os côcos dele. Não gostou da invasão nem da
abordagem. Foram muitos argumentos até que ele tivesse certeza que só íamos
entrar pra picotar a pulseira. Nada de pegar côco! No final das contas, depois de um bom papo,
rolou até um banho de mangueira. Rs! Banho de mangueira no meio da corrida também é massa!
Quase chegando ao PC3, havia a opção de seguir o caminho
pela linha do trem mas apareceu uma boiada do nada, pelos trilhos, que
nos demoveu imediatamente da ideia. E foi até bom porque o outro caminho tinha
um barzinho com água bem geladinha. Além disso, o barulho do trem passando nos
deu a certeza de que fizemos a melhor escolha.
O PC3 era no Hotel mesmo. Lá entregamos nossas
pulseiras picotadas e recebemos outro mapa da prova. Mas presta atenção
porque esse mapa já tinha escala diferente! Agora era pra pensar em escala
de 1:50.000. Coisa de Odisseia mesmo! Mapa na hora de sair, com escala
diferente.
Atravessamos a BR empurrando a bikes.
E quem quisesse que desobedecesse pra tomar uma penalidade de “horas” de
castigo.
Tínhamos muito chão pela frente, começando por 3,5km de asfalto, até entrar no canavial. Aliás, Odisseia sem canavial, não tem graça. A poeira subia loucamente. Teve uma hora em
que ouvi um barulho alto de carro grande se aproximando. Até comentei: “Aqui
tem alguma estrada com carro grande!”. Quando olhei pra trás, vi aquele
treminhão gigante, cheio de cana balançando, vindo em nossa direção. Oh Jesus!!
Só deu tempo de ir pra o canto da estrada e prender o nariz! A poeira subiu que não dava pra enxergar nada. Que delícia de vida!!! Era tudo que eu precisava! Nariz cheio
de meleca, sombrancelhas vermelhas e roupa incrustada de barro.
Treze quilômetros depois, encontramos a casa na beira do
lago com 11 degraus na frente. Bem que podíamos passar uns dias ali. Que casa
fofa! Parecia abandonada. Só a trilha pra chegar até lá já era um refresco e
tanto. Toda sombreada. E o lago, ah, o lago! Que lindo! Mas nem deu tempo de contemplar muito.
Seguimos empoeirados em direção ao PC5.
No caminho, nossos amigos, Maurão e Omar. Sempre uns
queridos, navegando muito bem, fortes, cochudos e batatudos! Encontramos uma
trilha depois de um rio, descemos, procuramos. Nada de PC5. Embolamos com
outras equipes e nada. Até que descobrimos que aquela não era a trilha do 5, e
sim a do 6. Putz! Que merda! Era muito pertinho!
....
Pausa para operação de salvamento! Omar começou a tossir tão
alto que parecia morte certa. (Ria não que foi sério!) O cabra se jogou no paredão, começou a se
sacudir... Maurão já estava prestes a começar sua subida quando gritamos pra
que voltasse pra socorrer seu parceiro. Ele aspirou gel de carboidrato e
assustou a gente. Era cada grito!!!
....
Hum! PC5, finalmente! E aquele outro era mesmo o caminho
para o PC6. Ok! Bom que foi mais rápido chegar lá. Deixamos as bicicletas pra começar o trekking rumo à natação.
Final de tarde, uma hora gostosa quando o sol vai embora e a temperatura fica
mais amena em Pernambuco. Também é a hora em que o pessoal da roça solta os
cachorros. E os cachorros de lá não são magrinhos iguais aos daqui não. Eles
são grandes, fortes, tem dentes grandes e latido alto, imponente! Fomos
escarrerados por, no mínimo, uns quinze cachorros. Era um tal de chutar,
espirrar água, latir mais alto, assoviar... Todos os recursos possíveis para
evitar uma mordidinha nas canelas. Só pra se ter uma ideia, um dos
organizadores da prova foi derrubado da moto por um cachorro. Já pensou, que
miséria?! Né pra rir não, minha gente!
....
Ah, sim! Voltemos ao PC6...
Fomos embora pra nadar no açude. A gente só precisava caminhar/correr 4 km, levar umas carreiras de cachorro, subir e descer muita ladeira, chegar na beira do açude, atravessar nadando
até a ilha pra alcançar o PC7 que, pra variar, estava preso a uma árvore
pintada de amarelo... E voltar!
O ponto de ataque ficava logo ali, depois daquele bar onde tocava um arrocha de
arrepiar os cabelos. Era noite! Os dois pescadores que
estavam numa barraca montada na beira do açude fizeram cara de espanto.
Disseram que todo mundo já tinha nadado e ido embora, de dia. Estávamos nós e duas duplas masculinas da categoria 50km. Um pescador acabou se oferecendo pra ficar por ali no barco, enquanto nadávamos. Isso a gente não podia negar! Que ótima ideia! Traçamos um azimute, pegamos os obrigatórios e entramos. Mas na ilha não tinha
uma luz, nem um lightstik, nadinha de nada pra pessoa se guiar!
Era #azimutepartiu! #nobreu!
A água estava uma delícia! Fui
nadando na surdina! O barquinho lá na frente, os rapazes espalhados por ali e
Vitor se adiantando. Parecia que aquela natação não acabava nunca. Tinha
sensação de que estava parada. Depois de variar muito entre o nado em estilos perereca e cachorrinho, consegui pisar no chão, aliás, na lama. Daí, subimos pra procurar a
árvore até encontrá-la.
Antes de iniciarmos os procedimentos de retorno, o
pescador fez a gentileza de dizer que não entraria naquela água de noite nem
que recebesse em dinheiro. Querem saber o porquê? Ora bolas, o açude era cheio
de jacaré e sucuri. Céus! Precisava aquela criatura dizer aquilo naquela hora?
Mas, ainda assim, eu preferi correr o risco virar comida de sucuri a ser
desclassificada da Odisseia. Foi um bom estímulo pra nadar mais rápido, dando aquelas olhadelas pra o lado de vez em quando.
Chegando do outro lado, lá estava Sérgio Bandeira e uma
equipe de resgate. Nós que resolvêssemos pegar carona de canoa! A prova estaria
perdida mesmo.
No tranquilo caminho de volta, compramos a melhor Coca-Cola do mundo no bar do arrocha. E também, mais adiante, avistamos a dupla masculina
de 100km seguindo para natação. Estávamos duas horas na frente deles. Tempo de
sobra pra concluir a prova em primeiro, não acham? Então eu vou contar um pedaço da história que eu não queria
que acontecesse. Na verdade, seria muito legal se só escrevesse resenha com sucesso.
Saímos do PC8, depois de comer, pegar o mapa e planejar,
pedalando, felizes da vida. Vale ressaltar que o mapa estava em escala de
1:25.000. O percurso era quase todo de estradão até a entrada do Vilarejo.
Chegando lá, seguiríamos direto até o fim da rua, que emendava com uma trilha com uma descida íngreme. Tudo verificado em medidas e azimute. Lá
embaixo, 200m por um córrego em direção a uma pequena nascente.
Muito simples! O PC 9 estaria numa árvore pintada de amarelo às margens do
córrego. "'Taquipariu", tinha muita árvore! Grandes e pequenas. Nada de árvore pintada de
amarelo. Entramos na mata uma vez. Repetimos a operação com um farol de bike, vasculhamos tudo, nada
de árvore. Subimos até a Vila pra fazer a conta toda de novo. Descemos,
entramos na mata por dentro do córrego, quando era possível caminhar por dentro
dele. Passávamos embaixo de tronco, subíamos pedras. Era buraco, aranha,
cansanção, plantação de carrapicho. Chegamos a subir um pouco o vale pra ver se
não estava no alto. Nada de PC.
Decidimos ir de novo até perto da Vila pra ver se não tinha
outra entrada. Descemos por outro caminho e voltamos porque o azimute era
completamente diferente.
Daí, chegou aquela dupla que estava duas horas depois
de nós. Quando eles fizeram a primeira tentativa, até entramos novamente.
Voltamos outra vez sem o PC. Eles também. Então, os rapazes, simplesmente, pegaram o farol de bike,
entraram outra vez na mata, saíram e foram embora. Sorrateiros como deve ser.
Nada de procurar conversa com a gente, rs! Enquanto isso, refletíamos nossa
derrota sentados num barranco. Estávamos ali, à 200m do PC, tinha quase 5
horas. Vitor já falava em desistir.
Pegamos as bicicletas e subimos em direção à Vila.
Inconformada, eu fazia mil reflexões. Estava desolada com a possibilidade de
ter que ir embora sem achar o PC9. Seria o fim da nossa prova. Nem dava pra
acreditar! Lembrei do nosso último Desafio dos Sertões, quando fomos desistindo
de pegar os PCs, um a um, até o desânimo nos abater completamente. Desistências
são sempre inesquecíveis.
Antes de irmos embora de uma vez, Vitor me convidou para um lanche embaixo de um
poste. Passava
da meia-noite. Peguei o mapa e comecei a falar:
- "-Vitor, saímos da Bahia pra fazer essa Odisseia
pra terminar a prova não, foi? Você sabe que se a gente for embora é
desclassificação, não é? Não é possível que todo mundo tenha vindo aqui e saído
sem achar o PC. Aqueles caras desceram, entraram no mato apenas duas vezes e
foram embora. Se eles não tivessem achado não teriam ido embora, sem dúvida. Já
perdemos a nossa primeira posição, eles foram embora faz tempo. Não temos nada
a perder. Por mim, eu ficava aqui até o dia amanhecer pra achar esse PC. Não
queria ir sem tentar de novo."
Vitor pareceu convencido de que deveríamos tentar mais uma
vez. Só queria saber o que fazer de diferente pra dar certo. Eu não sabia
exatamente. Só achei que, com um perímetro tão pequeno, não seria
impossível. Pronto! Descemos outra vez, entramos pelo córrego,
dessa vez com as duas lanternas de bike na mão, subimos duzentos metros por
dentro de água, lama, pedra e vegetação. Ficamos mais do que estropiados, cheios de
carrapichos. Quando chegamos nos duzentos metros, começamos a varredura. Virei
o farol para o meu lado direito e olha só quem estava lá! Um pé de pau! Aquele
pelo qual, provavelmente, passamos e não demos atenção, porque ele era bem
fininho... A gente não sabia se ria ou se chorava. Mais de cinco horas ali.
Depois de muita coisa de pensamento profundo dentro da minha cabeça, não quero nem escrever reflexões. Fiquem à vontade
para fazer isso porque minha cabeça gira até hoje. Como sempre digo, por mais
experiente que você se ache, cada prova tem situações diferentes. E não vale a
pena ficar culpando os outros mas, de repente, o SACI.. rs! Sei lá!
Felizes e remoçados, seguimos para o PC10, que ficava na "casa
do chapéu". Era bastante chão de estradão e muita poeira de traminhão. O bicho é
grande, tem três pedaços e anda numa velocidade danada canavial adentro. Vale a
pena usar toda sua iluminação para evitar acidentes. Muita estradinha emaranhada
para o PC mas o combinado era parar em qualquer situação de dúvida pra não
fazer mais nenhuma merda.
O PC11 estava numa casa na beira de uma estrada, no alto,
num lugar cheio de muriçoca. Podia se chamar “Alto da Muriçoca”. Bem
apropriado! Nossa comida reserva estava toda lá. Embora nem precisássemos mais
dela, aproveitamos pra reabastecer antes de ir para a chegada, já que a parte
do remo foi cortada.
Cruzamos a linha de chegada às 4 da manhã, com aquela boa e conhecida sensação de dever cumprido. E porque não dizer, de vitória. Vitória é
exatamente isso: Retroceder Nunca, Render-se Jamais e Divertir-se Sempre.
Eu tiro o meu chapéu para Sérgio Bandeira, que tem uma
equipe de trabalho super confiável e dedicada! Sem dúvida, merecimento! O cara quebrou a clavícula um
dia antes da prova, durante a marcação do percurso, não conseguia nem respirar
direito. Morri de dó! Acompanhou a prova toda e sua equipe deu um show de sintonia durante todo o tempo. Parabéns pela prova! Eu curti cada momento intensamente!
Agradeço muito à nossa equipe Aventureiros do Agreste. Afinal,
quando saímos pra correr uma prova dessas, levamos conosco um pouco de Mauro,
Gabi, Scavuzzi, Marcelo, Tadeu, Claudio, Lucy, Vande, Eudes, Igor, Herbert,
Maurício, Fábio, Gilson... Um pedacinho que cada experiência que vivemos juntos pra saber o que fazer nos piores perrengues!
Ao nosso treinador, Fernando Tadeu e Infinity Academia, muita gratidão. Graças
ao Desafio que você me propôs para a Corrida do CT, corri sem sofrer, embora
ainda não esteja na melhor forma. Nem sei se estarei algum dia, kkk! Vamos em frente que, muita coisa boa vai
rolar por essas corridas afora!
Ah! Vitor, você é O CARA!
Até logo pra vocês! Mês que vem tem mais resenha pra gente escrever.
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